
1824
Primeiros imigrantes germânicos chegam ao Rio Grande do Sul
No dia 25 de julho de 1824, os primeiros imigrantes germânicos se estabeleceram no Rio Grande do Sul. O grupo, formado por 39 pessoas, desembarcou na antiga Real Feitoria do Linho Cânhamo (Feitoria Velha), junto à margem esquerda do Rio dos Sinos. O local, a Feitoria Velha, originou mais tarde a cidade de São Leopoldo/RS.
A colonização de São Leopoldo foi importante para o desenvolvimento local e estadual. Após meados do século 19, com o crescimento das famílias, muitos colonos radicados nas colônias da região migraram para outros locais do Rio Grande do Sul, entre eles Lajeado e Estrela.

Representação da antiga sede da Feitoria do Linho Cânhamo, que foi utilizada para receber e abrigar os primeiros imigrantes alemães que aportaram no que viria a se tornar a Colônia Alemã de São Leopoldo, em 1824.
Fonte: Domínio Público.
Os motivos para a imigração no Brasil
A imigração germânica no Rio Grande do Sul, contudo, não foi a mais antiga do Brasil. Em 1818, imigrantes suíços se estabeleceram no atual município de Nova Friburgo, Rio de Janeiro. No sul da Bahia, duas colônias foram criadas antes: a Colônia Leopoldina (1818) e a Colônia Frankental (1821).
O processo de imigração alemã estava atrelado a necessidade do governo – na época da independência do Brasil e mesmo antes – de criar uma classe média na estrutura social brasileira, então formada pela aristocracia escravista e pelos sem posses. Essa classe média deveria ser capaz de desenvolver produtos agrícolas necessários ao abastecimento dos povoados em crescimento Brasil afora e também para os exércitos em campanha.
Havia também a pressão da Inglaterra, que estava ansiosa por novos mercados para suas manufaturas. O sistema escravista no Brasil consistia em um sério obstáculo à expansão inglesa, uma vez que o escravizado, privado de poder aquisitivo, limitava o consumo de mercadorias inglesas. Mesmo com a pressão, a extinção da escravidão no Brasil foi postergada. Assim, a primeira fase da colonização com imigrantes não portugueses esteve pautada pela expectativa da supressão do tráfico de escravizados.
Além disso, a imigração também foi motivada pela necessidade da formação de esquadrões de soldados destinados a defender a Independência do Brasil ante as pretensões portuguesas e as constantes invasões estrangeiras ao território brasileiro.
Por sua vez, os motivos dos alemães eram de outra natureza. Chegar ao Brasil representava a conquista de um espaço de sobrevivência, uma vez que a Alemanha, dividida na época em reinos, principados e ducados, estava arrasada devido às guerras napoleônicas. As lavouras estavam destruídas, as terras eram escassas para as famílias de muitos filhos, e a pobreza acompanhava muita gente. Assim, a proposta do governo aos alemães era tentadora, mesmo diante de dificuldades e incertezas.
A imigração no Sul do Brasil
Nesse cenário, os germânicos desempenharam um papel estratégico proposto pelo governo imperial. As terras do sul foram povoadas, garantindo a posse do território que fora tomado dos indígenas e em constante ameaça do avanço castelhano. Além disso, os alemães assegurariam a produção de alimentos cruciais ao desenvolvimento e a proteção do Brasil.
Com as pequenas propriedades rurais, o governo também pretendia desenvolver a agricultura, até então restrita ao abastecimento de subsistência. Da mesma forma, seria um modo de substituir os latifúndios baseados na mão de obra escrava.
Dessa maneira, em 1824, os primeiros colonos imigrantes chegaram na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, a primeira colônia alemã, que recebeu o nome de São Leopoldo. Cada família recebeu, gratuitamente, um lote de 160.000 braças quadradas (cerca de 73 hectares). No mesmo ano, foi escolhido o local para a povoação, junto da sede da antiga feitoria, logo depois transferido para um lugar chamado Passo Geral, onde em 1828 começou a ser construída a primeira igreja católica. Mais tarde, em 1833, foram demarcadas as primeiras quadras e lotes urbanos.

Vila de São Leopoldo e distribuição das colônias.
Fonte: Biblioteca Nacional.
O fluxo de novos imigrantes foi interrompido com a deflagração da Revolução Farroupilha (1835-1845) e pela falta de recursos financeiros para a colonização estrangeira. Em 1846 o processo migratório foi retomado, quando foram fundadas as colônias de Feliz, Mundo Novo, Bom Princípio e Santa Maria. Assim, em 13 anos, entre os anos de 1824 e 1847, 8.176 alemães deixaram sua pátria migrando para o Brasil.
Sucessivamente, foram sendo criadas mais colônias pela província, entre elas, nos vales do Rio Pardo e Taquari. Respectivamente foram fundadas a Colônia Santa Cruz, que recebeu colonos a partir de 1849 e mais tarde, em 1855, a Colônia dos Conventos, em Lajeado. Além dessas, outras foram criadas, as quais despontaram no cenário estadual pela produção de alimentos como as colônias de Estrela e Teutônia.
Além da imigração oriunda da Europa, a fundação de novas colônias pelo Estado provocou a imigração interna, ou seja, colonos da região de São Leopoldo, que estava com um contingente populacional expressivo, começaram a se estabelecer nas novas colônias.

Mapa mostrando a dispersão das colônias alemãs no sul do Brasil.
Fonte: Historical map of German colonies at South Brazil, 1905 (Domínio Público).
Em busca de melhores dias
A migração da Europa para o Brasil não foi uma aventura romântica, pois os imigrantes germânicos enfrentaram muitas dificuldades. A primeira delas era a travessia do Oceano Atlântico, quando enfrentavam cerca de 12 mil quilômetros, cuja viagem levava em média 100 dias, dependendo do navio. Geralmente a longa jornada era realizada em embarcações apertadas e com poucas condições.
Para os primeiros imigrantes as dificuldades ainda eram maiores, pois tudo era novo e a adaptação era difícil. Antes de chegar em São Leopoldo, os primeiros homens e mulheres que desembarcaram no Rio Grande do Sul permaneceram acampados alguns dias em Porto Alegre, para depois seguir ao seu destino. Depois de navegar em lanchões pelo Rio dos Sinos, foram conduzidos em carretas da margem do rio até a Real Feitoria do Linho do Cânhamo, local onde se abrigaram nos primeiros tempos.
Já nas colônias, em meio ao mato, construíram rústicas choupanas para se proteger do frio, da chuva e de muitos animais desconhecidos por eles. Com o passar do tempo, foram substituídas por casas mais sólidas. Da mesma forma, organizaram as primeiras lavouras, plantando vegetais que não conheciam, como a mandioca e a batata doce. Aos poucos, as condições melhoraram, o que permitiu retomar as velhas tradições culturais. Nesse aspecto, os imigrantes recriam seu modo de vida, mesclando hábitos e costumes.

Colonos alemães construindo choupanas de madeira em meio a mata de São Leopoldo no século 19.
Fonte: Desconhecido, século 19 (Domínio Público).
A imigração em números
Entre 1824 e 1939, foram criadas 142 colônias alemãs distribuídas em várias regiões do Rio Grande do Sul. No entanto, a imigração germânica não representa um percentual tão elevado de imigrantes em comparação com portugueses e italianos. Entre 1822 até 1950, segundo estatísticas brasileiras, cerca de 5 milhões de estrangeiros entraram como imigrantes no Brasil, sendo eles: italianos (1,5 milhões), portugueses (1,45 milhões), espanhóis (600 mil) e alemães (255 mil).
Mesmo em menor número, a etnia alemã contribui para a formação social, econômica e política de muitos municípios da região Sul do Brasil, especialmente nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina.No Rio Grande do Sul, as primeiras colônias foram criadas pelo governo imperial a partir da década de 1820, sendo elas as colônias de São Leopoldo, Três Forquilhas, São Pedro de Alcântara das Torres, São João das Missões (projeto fracassado – alemães se espalharam pela província) e São José do Hortêncio . entre elas: Vale dos Sinos, Planalto Central, Vale do Taquari, Rio Pardo e Sul do Estado.

Tempora mutantur, 1889, de Pedro Weingärtner, uma obra que retrata imigrantes alemães no meio rural do Rio Grande do Sul.
Fonte: Pedro Weingärtner, 1889 (Domínio Público).
Referências
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